terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Maquiavel Pedagogo
ou o ministério da reforma psicológica


Pascal Bernardin




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INTRODUÇÃO




          Uma revolução pedagógica baseada nos resultados da pesquisa psicopedagógica está em curso no mundo inteiro. Ela é conduzida por especialistas em Ciências da Educação que, formados todos nos mesmos meios revolucionários, logo dominaram os departamentos de educação de diversas instituições internacionais: Unesco, Conselho da Europa, Comissão de Bruxelas e OCDE. Na França, o Ministério da Educação e os IUFMs¹ estão igualmente submetidos a sua influência. Essa revolução pedagógica visa a impor uma “ética voltada para a criação de uma nova sociedade”² e a estabelecer uma sociedade intercultural. A nova ética não é outra coisa senão uma sofisticada reapresentação da utopia comunista. O estudo dos documentos em que tal ética está definida não deixa margem a qualquer dúvida: sob o manto da ética, e sustentada por uma retórica e por uma dialética frequentemente notáveis, encontra-se a ideologia comunista, da qual apenas a aparência e os modos de ação foram modificados. A partir de uma mudança de valores, de uma modificação das atitudes e dos comportamentos, bem como de uma manipulação da cultura³, pretende-se levar a cabo a revolução psicológica e, ulteriormente, a revolução social. Essa nova ética faz hoje parte dos programas escolares da França,4 e é obrigatoriamente ensinada em todos os níveis do sistema educacional.

         Estando claramente definido o objetivo, para atingi-lo são utilizados os resultados da pesquisa pedagógica obtidos pelos soviéticos e pelos criptocomunistas norte-americanos e europeus. Trata-se de técnicas psicopedagógicas que se valem de métodos ativos destinados a inculcar nos estudantes os “valores, as atitudes e os comportamentos” definidos de antemão. Por essa razão foram criadas os IUFMs, que se empenham em ensinar essas técnicas de manipulação psicológica aos futuros professores.

         Dentre os traços mais relevantes dessa revolução pedagógica, é preciso destacar os seguintes:

         • testes psicológicos, projetados ou já realizados, em grande escala;
         • informatização mundial das questões do ensino e, particularmente, o censo (ora em curso) de toda a população escolar e universitária, a pretexto de “aperfeiçoamento do ensino”. Participam aí os testes psicológicos. Noventa por cento das crianças norte-americanas já foram fichadas;
         • asfixia ou subordinação do ensino livre;
         • pretensão a anular a influência da família.

         A revolução pedagógica francesa, aliás recentemente acelerada, inscreve-se nesse quadro mundial. Nos últimos anos, numerosas modificações têm sido discretamente introduzidas no sistema educacional francês ou constituem, atualmente, objeto de debate. Os elementos de análise apresentados nos capítulos seguintes visam a evidenciar a coerência do projeto mundial no qual eles se integram.

         A primeira dessas reformas ocupa-se da formação de professores. As escolas normais foram substituídas pelos Institutos Universitários de Formação de Mestres (IUFMs). Eles se caracterizam pela importância que neles se dá às “ciências” da educação e à psicopedagogia. Esses institutos preparam os professores para a sua nova missão: redefinido o papel da escola, a prioridade é, já não a formação intelectual, mas o ensino “não cognitivo” e a “aprendizagem da vida social”. Também aqui o objetivo é modificar os valores, as atitudes e os comportamentos dos alunos (e dos professores). Para isso, são utilizadas técnicas de manipulação psicológica e de lavagem cerebral.

         A reforma na formação dos professores faz-se acompanhar de um considerável esforço no campo da formação continuada de todas as categorias de profissionais da educação: administradores, professores, diretores etc. devem igualmente estar adaptados à nova missão da escola.

         A revolução pedagógica está também presente nos estabelecimentos escolares. Assim, a estrutura das escolas primária e maternal5 foi modificada para substituir as diversas séries dos três ciclos6 que reúnem alunos de níveis diferentes. Os ensinos formal e intelectual são negligenciados em proveito de um ensino não cognitivo e multidimensional, privilegiando o social. A reforma pedagógica introduzida no Ensino Médio tende igualmente a uma profunda modificação das práticas pedagógicas do conteúdo do ensino.

         Simultaneamente, um vasto dispositivo de avaliação dos alunos é implementado. Por fim, ele deve ser informatizado, para ser utilizado em caráter permanente, e abrangerá o ensino não cognitivo, tal como a educação ética, cívica e social.

         Essa revolução pedagógica, introduzida discretamente, mediante discretas manobras, sem deixar ver sua arquitetura geral, precisa levar em conta com a resistência dos professores, que jamais permitiram o aviltamento de seu ofício e de seus alunos. Desse modo, aplicam-se técnicas de descentralização, oriundas diretamente das técnicas de administração e de gestão de “recursos humanos”. Consegue-se com isso envolver, engajar psicologicamente os professores e, portanto, reduzir sua oposição. Os “projetos escolares” são a aplicação direta dessa filosofia manipulatória.

          Ademais, o nível escolar continuará decaindo, o que aliás não surpreende, já que o papel da escola foi redefinido e que sua missão principal não consiste mais na formação intelectual, e sim na formação social das crianças; já que não se pretende fornecer a elas ferramentas para a autonomia intelectual, mas antes se lhes deseja impor, sub-repticiamente, valores atitudes e comportamentos por meio de técnicas de manipulação psicológica. Com toda nitidez, vai-se desenhando uma ditadura psicopedagógica.

         No momento mesmo em que os democratas maravilham-se de sua vitória sobre o comunismo, alguns observadores se questionam, lembrando-se do que disse Lênin: “É preciso [...] estar disposto a todos os sacrifícios e, inclusive, empregar – em caso de necessidade – todos os estratagemas, ardis e processos ilegais, silenciar e ocultar a verdade”.7 Sérias interrogações subsistem quanto à natureza e a profundidade das reformas empreendidas na antiga URSS. Essas interrogações, que não poderiam ser abordadas no âmbito desse opúsculo, formam-lhe, contudo, a trama.

         Outros há que evocam a tese da convergência entre capitalismo e comunismo, defendida ainda há pouco por algumas organizações internacionais por A. Sakharov e por tantos outros. Sua perspectiva é mais ou menos ampla que a precedente? É ela, enfim, mais justa? Não é nossa pretensão responder a essas perguntas, ligadas intimamente às suspeitas que pesam sobre a perestroika.

         Entretanto, essas interrogações formam o pano de fundo desse estudo. Escrito de circunstância, cuja redação se ressente da brevidade o tempo que nos foi atribuído, ele não pretende outra coisa senão esclarecer seus leitores acerca do que realmente e está em jogo nos debates atuais acerca da reforma no sistema educacional. Ele evitará, portanto, abordar frontalmente as questões de política internacional. Constata-se, porém, que tais questões não poderiam permanecer por muito tempo sem resposta.

          Há quem nos censure o fato de havermos insistido demasiado no aspecto criptocomunista da revolução pedagógica por nós exposta, privilegiando de facto a primeira das duas hipóteses. Convimos com isso de boa vontade, mas temos duas razões para haver assim procedido. Em primeiro lugar, o aspecto criptocomunistas dessa revolução pedagógica não poderia ser seriamente contestado. Culminância dos trabalhos realizados desde há quase um século nos meios revolucionários norte-americanos, retomados e desenvolvidos ulteriormente pela URSS e pela Unesco, ela traz em si as marcas de sua origem. Além disso, reconhecer tais origens, admitir que nos encontramos face a uma temível manobra criptocomunistas, não exclui, em absoluto, a hipótese globalista da convergência entre capitalismo e comunismo. Mais ainda, essa segunda hipótese na verdade supõe a presença de um forte elemento criptocomunistas na sociedade posterior à desaparição da cortina de ferro.

         Assim, rogamos ao leitor que considere como os fatos expostos nas páginas a seguir se podem integrar em dois quadros diversos de análise e de interpretação, os quais não pretendemos discriminar. Seria isso possível, aliás, considerando-se que os acontecimentos estiveram subordinados a relações de força extremamente complexas e sutis, capazes de orientar a história em uma direção imprevista? E considerando que os próprios protagonistas estão, em sua imensa maioria, tanto do Oeste quanto do Leste, inconscientes do sentido da História, que transcende infinitamente a dialética criptocomunismo versus globalismo?



         As organizações internacionais preservam-se por meio de expedientes como este: “As opiniões expressas no presente estudo são de inteira responsabilidade do autor e não refletem necessariamente o ponto de vista da Organização X.” Se essa ressalva é verdadeira, stricto sensu, é necessário, não obstante, considerar que a organização internacional, que editou tais opiniões, julgou-as suficientemente próximas das suas, já que não apenas deixou de censurá-las mas, além disso, garantiu e financiou sua publicação. Exatamente como a mídia, as organizações internacionais exercem sua influência não tanto pelas opiniões que defendem como por meio dos autores aos quais elas concedem a palavra e pelas teses que elas difundem, desse modo, sob sua autoridade. Ademais, as teses que havemos de expor são todas elas representativas das correntes de ideias que perpassam os meios globalistas. Nas referências, mencionaremos explicitamente as publicações em que não são feitas quaisquer reservas.



1IUFM: Instituto universitário de formação de mestres.

2Parlamento Europeu, Documento de Sessão, Relatório da Comissão da Cultura, da juventude, da educação e das mídias sobre La politique de l’éducation et de la formation dans la perspective de 1993, 27 mar. 1922, p. 33. A-3-0139/92.

3Cf. Seminário europeu de professores, Kolmarden, Norrköping, Suécia, 10-14 jun. 1985, La formation interculturelle des enseignants, Strasbourg, Conselho da Europa, 1987, p. 19 e 2. (DECS/EGT (86) 83-F).

4Cf. 4ª. Conferência dos ministros da educação dos estados membros da região Europa, Perspective et taches du développement de l’éducation en Europe à l’aube d’um nouveau millenaire, Paris, Unesco, 1988, p. 11 (ED-88/MINED-EUROPE/3). Documento naturalmente publicado sem reserva sobre as opiniões dispostas pelos seus autores.

5Equivalente à fase da creche e da pré-escola no sistema educacional brasileiro – N. do T.

6No sistema educacional francês, são três os ciclos das séries iniciais, que comportam de duas a três etapas, assim organizados: ciclo dos primeiros aprendizados: pequena seção, média seção, seção maior; ciclo das aprendizagens fundamentais: curso preparatório e curso elementar 1; ciclo de aprofundamento: curso elementar 2, curso médio 1 e curso médio 2 – N. do T.

7V. Lenine, La maladie infantile du communisme, Paris, Editions sociales, Moscou, Editions du progrès, 1979, p. 69




BERNARDIN, Pascal. Maquiavel Pedagogo – ou o ministério da reforma psicológica. 1 ed. Ecclesia e Vide Editorial. Campinas, SP: 2013, pp. 9-14



Segue um vídeo sobre o livro, feito por Ana Caroline Campangolo Bellei. A moça oferece ainda uma conceituação básica para a compreensão o livro: Criptocomunismo; Multicultural; Intercultural.


Leia também o primeiro cap. de Maquiavel Pedagogo: "As técnicas de manipulação psicológica"


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